Cuiabá, 16 de Dezembro de 2025

BRASIL Terça-feira, 16 de Dezembro de 2025, 07:37 - A | A

Terça-feira, 16 de Dezembro de 2025, 07h:37 - A | A

Na véspera de votaçã

PL da Dosimetria encontra resistência e sofrerá mudanças no Senado

Texto beneficia o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros condenados do 8 de janeiro de 2023, mas também abre brecha para favorecer pessoas enquadradas em outros crimes

O Globo

Após a acelerada tramitação na Câmara, o projeto da dosimetria enfrenta dificuldades para avançar no Senado e deve ser alterado pelo relator, o senador Esperidião Amin (PP-SC). O texto beneficia o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros condenados do 8 de janeiro de 2023, mas também abre brecha para favorecer pessoas enquadradas em outros crimes, como coação no curso de processo e favorecimento à prostituição, o que deve ser revisto no Senado.

 Parlamentares tentam articular uma manobra para restringir o texto a Bolsonaro e aos condenados do 8/1, sem que o projeto tenha que voltar à Câmara. Uma das possibilidades estudadas seria usar emendas de redação, instrumento para corrigir imprecisões, mas sem a obrigatoriedade de retornar à Casa vizinha. Com isso, o Senado evitaria que o debate se prolongasse no Legislativo.

Responsável pelo relatório em elaboração na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Amin deve incorporar emendas de autoria dos senadores Otto Alencar (PSD-BA), presidente do colegiado, e Sergio Moro (União-PR). O objetivo é enviar a matéria à sanção ainda este ano, embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já tenha sinalizado que vai vetar a proposta.

‘Emendas adequadas’
As sugestões de mudanças limitam justamente a aplicação das novas regras aos crimes apurados em investigação do 8 de Janeiro, alcançando os condenados que invadiram as sedes dos três Poderes, além de Bolsonaro e demais réus punidos pela trama golpista.

— Olha, nós já temos pelo menos duas emendas que merecem uma atenção especial, porque elas praticamente objetivam salvar o projeto na deliberação do Senado. Objetivam restringir o alcance aos apenados pelo inquérito de 8 de janeiro. São emendas muito adequadas ao propósito original do projeto — afirmou o relator.

O projeto da dosimetria chegou ao Senado sob a justificativa de corrigir penas impostas aos condenados por atos golpistas, mas passou a ser alvo de críticas após a aprovação, na Câmara, de um texto que alterou regras da Lei de Execução Penal.

Como mostrou o GLOBO, o texto permite a progressão de regime com 16% da pena cumprida para uma série de crimes cometidos com violência ou grave ameaça que hoje exigem 25%.

São tipo penais como exploração violenta da prostituição, interferência violenta em licitações, incêndio doloso, resistência, coação no curso do processo e atentado à soberania nacional, além dos crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de Direito.

 

 

A emenda apresentada por Otto Alencar, já protocolada na CCJ, estabelece que as disposições da lei se aplicam “exclusivamente” aos crimes cometidos no contexto dos atos golpistas.

Na justificativa, o senador baiano sustenta que, sem essa delimitação clara, o projeto aprovado pela Câmara permite a aplicação genérica dos critérios de dosimetria penal, com potencial para beneficiar condenados por outros crimes. Segundo ele, essa ampliação compromete princípios constitucionais como proporcionalidade, razoabilidade, isonomia e segurança jurídica.

Para o presidente da CCJ, seria “uma temeridade” aprovar o projeto com a redação atual. O senador também disse que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), está alinhado com esse encaminhamento.

— Eu tenho certeza de que, do jeito que está, esse texto não passa. Seria uma temeridade aprová-lo, e eu concordo com o presidente Lula em vetar o projeto da forma como veio para o Senado — afirmou Alencar.

A leitura do relatório está prevista para amanhã na CCJ. O senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) disse ao GLOBO que pretende pedir vista após a apresentação do parecer.

— A ideia é pedir vista após a leitura, mas pode ser uma vista curta, de horas. Dependendo do andamento, é possível votar ainda na quarta-feira — disse ele.

O presidente da CCJ afirmou ainda ter conversado com senadores como Renan Calheiros (MDB-AL), Eduardo Braga (MDB-AM), Omar Aziz (PSD-AM), Alessandro Vieira (MDB-SE), além de Amin.

Segundo ele, há no Senado a disposição de examinar o texto “item por item” e barrar qualquer solução que mantenha as brechas apontadas desde a tramitação na Câmara.

O governo também se mobiliza para travar a tramitação do texto. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Gleisi Hoffmann, citou as manifestações de rua do fim de semana, realizadas em quase todas as capitais. “As ruas do país falaram alto outra vez neste domingo: Sem Anistia! Sem redução de penas! Quem foi condenado por atentar contra a democracia tem de pagar por seus crimes. O Brasil não quer andar pra trás”, escreveu ela em uma rede social. 

Um dos parlamentares mais atuantes na área da segurança pública, Alessandro Vieira reclamou da pressão sobre esse assunto específico e lembrou que a Câmara decidiu na segunda-feira não correr para votar este ano o projeto antifação e a PEC da Segurança Pública.

— A Câmara deixou para o ano que vem a PEC da Segurança e (o projeto) antifacção. Isso diz bastante sobre o andar das coisas. Vejo muitos colegas populistas dizendo que o PL da Dosimetria deve ser votado rapidamente, para que essas pessoas passem Natal em casa, o que é mentira. O texto ainda precisaria passar por sanção ou veto, além de passar por juiz para recálculo das penas. Então, na prática, não faz diferença ser votado a toque de caixa e, a que tudo indica, não será concluído esse ano no Congresso — diz Vieira.

Pena de Bolsonaro
As alterações no Senado não devem interferir na redução de pena de Bolsonaro. Condenado a 27 anos e 3 meses de prisão, o ex-presidente deve ser, pelo projeto, punido com uma pena de 22 anos e um mês. O período em regime fechado cairia de 5 anos e 11 meses, prazo previsto atualmente, para 3 anos e 3 meses. Com isso, ele sairia da cadeia, no máximo, no início de 2029.

De acordo com os cálculos do relator na Câmara, Paulinho da Força (Solidariedade-SP), a redução pode ser ainda maior no caso de Bolsonaro, para até 2 anos e três meses preso em regime fechado, levando em consideração vários fatores que podem impulsionar a progressão de pena.

A Lei de Execuções Penais prevê a progressão de regime para réus primários que cometeram crime “sem violência à pessoa ou grave ameaça” a partir do cumprimento de 16% da pena. Quando há atos violentos, esse porcentual aumenta para 25%. É o caso dos crimes nos quais Bolsonaro foi condenado.

 

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