As tensões entre Estados Unidos e Venezuela atingiram um novo patamar com o envio de navios de guerra norte-americanos ao Caribe e a mobilização de milicianos venezuelanos em território nacional. Enquanto Washington acusa Nicolás Maduro de liderar um cartel de drogas internacional, Caracas denuncia uma ameaça militar e promete reagir caso sofra ataques.
No final de julho, os EUA classificaram o chamado Cartel de los Soles como organização terrorista internacional, alegando que o grupo, vinculado a altos escalões políticos e militares da Venezuela, opera desde o fim dos anos 1990 para enviar drogas aos EUA.
Pouco depois, o governo Trump reiterou que Maduro é o líder do cartel e dobrou a recompensa para US$ 50 milhões por informações que levassem à prisão do líder.
Em resposta, Maduro rejeitou as acusações, chamou as denúncias de “mentiras” e disse que “nenhum império tocará o solo sagrado da Venezuela”. O presidente afirmou que, em caso de agressão, “declararia constitucionalmente a república em armas” e comparou a situação à crise dos mísseis de Cuba, em 1962.
A escalada incluiu movimentações militares significativas no Caribe. Os EUA enviaram quatro mil soldados, três destróieres equipados com mísseis guiados, um submarino nuclear e aeronaves de reconhecimento. Segundo o Departamento de Defesa dos EUA, a operação tem como objetivo conter o tráfico de drogas supostamente operado e financiado por Caracas.
Um oficial americano de defesa declarou à CNN que, por enquanto, o aumento de tropas funciona como demonstração de força, mas também abre margem para ações militares, caso autorizadas.
Do lado venezuelano, Maduro anunciou a mobilização de 4,5 milhões de milicianos e iniciou registros em diferentes cidades do país. O ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, confirmou o envio de navios às águas territoriais e o deslocamento de 15 mil militares para os estados fronteiriços de Táchira e Zulia.
Apesar da retórica, especialistas avaliam que uma invasão direta é improvável. José Antonio Hernández Macías, doutor em Estudos Latino-Americanos pela Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), explicou à CNN americana que o custo político e humanitário seria alto e poderia envolver potências como a China.
Segundo ele, o mais provável seria o uso de “ações mais direcionadas, como ataques de drones, para desmantelar operações ligadas ao narcotráfico”.
Na mesma linha, o pesquisador José Briceño Ruiz, também da UNAM, disse que a mobilização americana pode resultar em “atividade cirúrgica” contra alvos específicos. “Pode ser para destruir a infraestrutura do chamado Cartel de los Soles ou atingir líderes do governo venezuelano que têm mandado de prisão nos Estados Unidos”, afirmou.
Além de Maduro, Washington acusa Diosdado Cabello, atual ministro do Interior e Justiça, e Vladimir Padrino, ministro da Defesa, de envolvimento no tráfico de drogas. Os EUA oferecem US$ 25 milhões pela captura de Cabello e US$ 15 milhões por Padrino.
Para analistas, a operação militar americana pode servir também como instrumento de pressão política. “Vejo isso como uma forma de chamar atenção e limitar a atuação de grupos de tráfico ilegal de drogas”, disse Briceño Ruiz.
O risco de confronto, no entanto, preocupa. O analista Gabriel Pastor, do Centro de Estudos da Realidade Econômica e Social (CERES), lembrou em artigo que, embora improvável, uma invasão não pode ser descartada diante da política externa de Donald Trump. “Se ocorrer, seria o Noriega do século XXI”, disse, em referência à operação militar que derrubou o ditador panamenho em 1989.
Por ora, o cenário mais provável é a manutenção da pressão norte-americana combinada com a resposta defensiva de Caracas.