Com a imposição de tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, especialistas alertam: reverter o chamado “tarifaço” exigirá mais do que discursos ou manifestações diplomáticas.
A única alternativa viável, segundo analistas, passa por negociação direta — abrangendo tarifas e também questões políticas exigidas pelos norte-americanos como parte do pacote.
“O governo brasileiro precisa avaliar o interesse real em manter exportações para os Estados Unidos. Isso requer disposição para tratar também de temas políticos impostos pelos americanos. Sem essa abertura, a negociação não avança”, afirma Rodrigo Giraldelli, especialista em comércio exterior e CEO da China Gate.
‘Jogo de forças’
Na análise de Giraldelli, os Estados Unidos utilizam a tarifa como instrumento de pressão.
A estratégia, aplicada anteriormente em negociações com Europa, Indonésia e China, segue um padrão característico de Trump: adotar medidas extremas para, em seguida, transformar o impasse em vantagem diplomática.
“O entrave está na exigência americana de incluir temas políticos nas conversas. A Casa Branca não aceita limitar a pauta às questões econômicas.”
Segundo ele, o Brasil resiste a abordar tópicos sensíveis, como o caso Bolsonaro, eventuais anistias e decisões do Supremo Tribunal Federal com impacto sobre empresas dos EUA — entre elas, a Starlink. Essa recusa, na visão do especialista, trava o avanço das conversas.
Efeitos imediatos e riscos futuros
Rodrigo Provazzi, consultor em gestão de risco, destaca os impactos diretos da nova tarifa, que atinge 36% das exportações brasileiras aos EUA, com prejuízos já sentidos por setores como carne, café, cacau, frutas e açúcar.
Entre os efeitos mais imediatos, Provazzi aponta:
- Pressão inflacionária provocada pela desvalorização cambial;
- Redução do superávit comercial com os EUA;
- Perda de confiança de investidores internacionais.
Embora China e União Europeia possam absorver parte desses produtos, a transição exige tempo, diplomacia, adaptação regulatória e investimentos logísticos — sobretudo diante das exigências ambientais impostas pelo mercado europeu.
Ambos os especialistas defendem uma postura firme, sem hostilidade. Para Provazzi, o país deve preservar sua soberania sem sacrificar o diálogo, apostando em diplomacia comercial, incentivos industriais e reequilíbrio da balança por meio de acordos bilaterais e multilaterais.
“Negociar, neste contexto, não significa ceder. Trata-se de dialogar, esclarecer posições e buscar um entendimento que favoreça os dois lados”, reforça Giraldelli.
Segundo ele, recorrer à OMC pode ter valor simbólico, mas resultados concretos só devem aparecer no longo prazo.
“A medida adotada prejudica também o consumidor americano, mas trata-se de uma decisão soberana e juridicamente válida do ponto de vista dos Estados Unidos”, acrescenta.
Oportunidades
Apesar da tensão, o cenário oferece chances de diversificação de mercados, fortalecimento da base produtiva nacional e estímulo à inovação e ao valor agregado nas exportações.
Provazzi lembra que o Brasil possui ativos estratégicos relevantes — como o agronegócio e a transição energética —, que podem ser mobilizados para ampliar a presença internacional e obter ganhos diplomáticos futuros.
“Com uma postura firme e diplomática, o país pode proteger seus interesses essenciais, manter sua estabilidade econômica e fortalecer sua inserção internacional”, conclui o consultor.