O secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Itamaraty, embaixador Philip Gough, condenou, em discurso apresentado na Organização Mundial do Comércio (OMC) nesta quarta-feira (23), tarifas "arbitrárias", anunciadas e "implementadas de forma caótica".
A manifestação ocorreu durante reunião do Conselho Geral da OMC, em Genebra, na Suíça. Em seu pronunciamento, o representante brasileiro registrou profunda preocupação com "uso de medidas comerciais como instrumento de interferência em assuntos internos de outros países".
No entanto, não citou diretamente o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A nove dias da data prevista para a implementação do "tarifaço" anunciado pelo republicano, o governo brasileiro defende que não pretende sair da mesa de negociações.
No último dia 9, Donald Trump anunciou que o governo dos EUA irá taxar em 50% os produtos brasileiros vendidos no mercado americano a partir de 1º de agosto.
No discurso desta quarta, o enviado do governo brasileiro destacou que tais medidas "estão interrompendo as cadeiras de valor globais e correm o risco de lançar a economia mundial em uma espiral de preços altos e estagnação".
Além disso, sanções unilaterais desse tipo "equivalem a uma violação flagrante dos princípios fundamentais que sustentam a OMC e são essenciais para o funcionamento do comércio internacional".
A apresentação de um recurso à OMC foi uma das medidas anunciadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na tentativa de conter a implementação das tarifas de 50% sobre exportações brasileiras em território americano.
Desde que o presidente Lula passou a mencionar a possibilidade de o Brasil recorrer formalmente ao órgão internacional, diplomatas têm avaliado que o órgão de solução de controvérsias da instituição está paralisado e sem capacidade de agir e, mesmo que tome uma decisão, sem força para implementar.
Diante disso, entendem que um eventual recurso formal representaria um gesto político, sem produzir decisões efetivas.
Nesse cenário, colocam que uma possibilidade seria o Brasil recorrer conjuntamente com outros países afetados pelo tarifaço.
O presidente também já afirmou que avalia reagir com a Lei da Reciprocidade Econômica e impor tarifas semelhantes, caso as negociações não se mostrem eficazes. O governo enxergou nas medidas uma tentativa de intervir na soberania do país.
A Lei de Reciprocidade Econômica permite que o governo brasileiro adote medidas de retaliação contra países ou blocos econômicos que apliquem barreiras comerciais, legais ou políticas contra o Brasil.
Uso de tarifas como ameaças
O embaixador Philip Gough também afirmou que, além das violações "generalizadas" às regras do comércio internacional, estamos "testemunhando uma mudança extremamente perigosa em direção ao uso de tarifas como uma ferramenta nas tentativas de interferir nos assuntos internos de outros países".
"Continuaremos a priorizar soluções negociadas e a confiar em boas relações diplomáticas e comerciais. Caso as negociações fracassem, recorreremos a todos os meios legais disponíveis para defender nossa economia e nosso povo – e isso inclui o sistema de solução de controvérsias da OMC".
Na visão do Ministério das Relações Exteriores, negociações baseadas em "jogos de poder" são atalhos perigosos para a instabilidade e contextos de guerra.
"Diante da ameaça de fragmentação, a defesa consistente do multilateralismo é o caminho a seguir. Ainda temos tempo para salvar o Sistema Multilateral de Comércio. O Brasil continua pronto para discutir e cooperar nesse objetivo", prossegue.